Tenho fama de ser hipocondríaca. É por isso que há uns anos (cerca de 15, talvez), parti um pé, mas só tive a confirmação do diagnóstico um mês após o sucedido.
Sei que a fama não é completamente infundada: admito que sou exagerada. Dramática, até. Perante um acontecimento que possa ter consequências catastróficas, esse é o caminho seguido e a hipótese acolhida. Felizmente, com o passar do tempo, vamos tomando consciência dos defeitos que temos e faltas que cometemos e tentamos contorná-los ou mitigá-los. Nem sempre resulta, claro.
Parece que o cansaço que sentia era, afinal, o bicho que anda nas bocas e corpos do mundo. E agora, ei-lo, acomodando-se no meu organismo, produzindo um cansaço sem fim e tosse.
Avaliando a minha situação de um ponto de vista global, estou bem. Estou óptima, até. O oxigénio não tem faltado e não necessito de assistência médica. Não serei hospitalizada e isso são muito boas notícias.
Contudo, a solidão e a tristeza são inevitáveis. Não por mim, ainda que custe pensar que não poderei aproximar-me de ninguém sem máscara nos próximos três meses, mesmo tratando-se da minha sobrinha. As minhas caretas e figuras tontas não poderão mais ser vistas por ninguém, a não ser através de videochamada. Mas isso são ninharias quando penso em quem perdeu familiares para isto e nos médicos, enfermeiros, auxiliares (a malta parece esquecer-se deles e é muito injusto) que há quase um ano que vivem dentro de fatos de astronauta, com a saúde no limite. Penso em todos os que ficarão com sequelas para a vida e naqueles que, por sofrerem com outras patologias, também se viram afectados por este vírus demoníaco.
Penso muito no que virá a seguir a este episódio desta série de muito má qualidade, e, pessimista como sempre fui, receio. Não sei o que, ou quem se salvará disto. E nem me refiro concretamente às infecções. Pior do que o bicho, preocupam-me a loucura e o egoísmo que parece ter contagiado algumas cabeças. É que essas, nem com vacinas lá vão.