Tuesday, October 2, 2012

Sem número, número 6 (parte I)

[A mia ilustríssima Sorella - que tanto respeito e admiro que até escrevo o nosso grau de parentesco com letra maiúscula - disse-me, há dias, que do que ela gostava por estas bandas eram as pequenas estórias parvas que «contava». Atendendo ao seu pedido, aqui vai outra. Das bandas do Oriente, pois claro, porque por lá, meia volta, aconteciam coisas «diferentes». Ah, e já agora, porque quem manda aqui sou eu, posso contar as estórias enquadrando-as como a minha mãe. Ou seja, mencionando pormenores irrelevantes. E dito isto, cá vou eu.]

Como as duas ou três pessoas que lêem este blogue já devem saber - até porque, certamente, são membros da minha família próxima - fui ao Japão há uns anos. Era Primavera e ao nascer do dia, os corvos pousavam nas cerejeiras e podíamos escutá-los no hostel onde estava e... e isto não tem nada a ver com o que quero contar. Era só para acrescentar uns pormenores irrelevantes como às vezes a Mãe faz. Busted!


No tal hostel onde fiquei havia muitos turistas ocidentais e, metendo conversa ao pequeno-almoço uns com os outros na sala comum, fomos saindo em grupos. Sai com um rapaz belga, da Flandres - todos parecem ser de lá - e fomos a Ozakajó, o castelo de Osaka, para depois apanharmos o comboio para Nara.

O moço belga e eu pedimos indicações a um tipo que estava no hostel e que já estava no Japão há uns meses. Ele lá nos disse que tínhamos de passar do metro para a linha do comboio e assinalou num esquema dos meios de transporte cheio de linhas e cores diferentes o percurso que tínhamos de fazer. Hoje já não conseguiria orientar-me sozinha com aquele esquema, porque tudo parecia igual. Caminhos-de-ferro estatais, caminhos-de-ferro privados, loop-line, metro, tudo era o mesmo: linhas cinzentas de gradação diferente num pedaço de papel com uns nomes em alfabeto latino. Aliás, ainda hoje guardo esse esquema e, de cada vez que olho para ele, penso em como terei conseguido sair dali para o aeroporto seguindo as orientações da folha.

A aventura começou logo na primeira estação de metro. Se a memória ainda me é fiel, tínhamos de comprar os bilhetes de metro sabendo para que estação ou grupo de estações nos dirigíamos. Ficámos a olhar durante algum tempo para o esquema na parede da estação, em frente da parede com as máquinas de bilhetes, até que, por não nos entendermos bem nesse ponto, o rapaz apontou para o botão que dizia «Se necessitar de informações carregue aqui» (ou uma coisa do género) e disse que o melhor era falar com alguém dali que nos explicasse como era aquilo. Ele carregou no botão e esticámos as orelhas para escutar bem a voz. E eis que, subitamente, uma cabeça surge da parede, para grande espanto nosso. Uma cabeça a sair da parede, do meio das máquinas encastradas. Saltámos nos nossos lugares, tal o susto, e tenho a certeza que ficámos de olhos bem arregalados a olhar para aquela cabeça que, no mesmo segundo que sai cá para fora, arranca-nos as moedas das mãos, mete na máquina e recolhe-se à parede. Foi tudo muito rápido, mas ainda deu para espreitarmos e percebermos que o interior da parede comportava uma pequena salinha onde o homem passaria as suas horas (ou dias) de trabalho. Agora, sempre que no metro, em Lisboa, os meus olhos pousam naqueles botões próximos das saídas em que deve estar escrito algo como «Para informações, ou falar com um funcionário, carregue aqui», eu penso na cabeça que sai da parede.

[To be continued...]

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