Friday, January 29, 2021

Diário da Peste #1

Tenho fama de ser hipocondríaca. É por isso que há uns anos (cerca de 15, talvez), parti um pé, mas só tive a confirmação do diagnóstico um mês após o sucedido. 

Sei que a fama não é completamente infundada: admito que sou exagerada. Dramática, até. Perante um acontecimento que possa ter consequências catastróficas, esse é o caminho seguido e a hipótese acolhida. Felizmente, com o passar do tempo, vamos tomando consciência dos defeitos que temos e faltas que cometemos e tentamos contorná-los ou mitigá-los. Nem sempre resulta, claro.

Parece que o cansaço que sentia era, afinal, o bicho que anda nas bocas e corpos do mundo. E agora, ei-lo, acomodando-se no meu organismo, produzindo um cansaço sem fim e tosse.

Avaliando a minha situação de um ponto de vista global, estou bem. Estou óptima, até. O oxigénio não tem faltado e não necessito de assistência médica. Não serei hospitalizada e isso são muito boas notícias.

Contudo, a solidão e a tristeza são inevitáveis. Não por mim, ainda que custe pensar que não poderei aproximar-me de ninguém sem máscara nos próximos três meses, mesmo tratando-se da minha sobrinha. As minhas caretas e figuras tontas não poderão mais ser vistas por ninguém, a não ser através de videochamada. Mas isso são ninharias quando penso em quem perdeu familiares para isto e nos médicos, enfermeiros, auxiliares (a malta parece esquecer-se deles e é muito injusto) que há quase um ano que vivem dentro de fatos de astronauta, com a saúde no limite. Penso em todos os que ficarão com sequelas para a vida e naqueles que, por sofrerem com outras patologias, também se viram afectados por este vírus demoníaco.

Penso muito no que virá a seguir a este episódio desta série de muito má qualidade, e, pessimista como sempre fui, receio. Não sei o que, ou quem se salvará disto. E nem me refiro concretamente às infecções. Pior do que o bicho, preocupam-me a loucura e o egoísmo que parece ter contagiado algumas cabeças. É que essas, nem com vacinas lá vão. 

Monday, January 25, 2021

Sem número, número 48: Lei de Murphy

Algures entre Novembro e Dezembro de 2007, no meu primeiro emprego a sério, trabalhei 30 dias sem parar, sem fins-de-semana ou folgas. Era uma miúda e por uma série de motivos que não interessa desenvolver aqui, não me importei muito. Mas também porque sabia que no final desses 30 dias teria cinco de descanso por causa do Natal.

No último dia de trabalho antes das férias, quando estava para sair de casa, de manhã, tive a minha primeira contratura lombar. Não sabia o que era e sofri bastante, mas, muito curvada, lá fui trabalhar. Com drogas e pomadas, aguentei até ao final do dia, mas não me recordo se fui ou não a pé para casa. 

O dia seguinte, véspera de Natal, passei-o sozinha em casa, imobilizada na cama. Nesse dia, comi uma caixa de chocolates e bebi água, porque eram as duas coisas ao alcance do braço (os chocolates eram uma lembrança de Natal que recebera no dia anterior). Não conseguia sequer levantar-me para ir à cozinha. 

Umas semanas ou meses depois, contei isto a uma colega de trabalho. Ela riu-se muito e disse que eu era a personificação da Lei de Murphy. Não sei se alguma vez tinha ouvido falar do conceito, mas nunca mais o esqueci. 

Hoje é dia 25 de Janeiro de 2021. Passaram pouco mais de 13 anos desde esses eventos. Estou mais velha, já tive mais contraturas e envolvi-me em mais incidentes, como há pouco mais de duas semanas, quando fiz um lenho no nariz ao bater com a cara num sinal de trânsito. 

Entre o dia de ontem, em que o meu avô fez anos (87!), e o dia de hoje, o Murphy veio visitar-me. Entre derrubar uma caneca no computador, pôr um pé numa poça de água e molhar a perna, despejar um chávena de chá no colo e ter um cotonete enfiado no nariz até sentir o cérebro doer, só posso dizer que esta segunda-feira está muito perto de destronar aquele distante Dezembro em que percebi finalmente o verdadeiro significado do Natal. E da Lei de Murphy. 

Thursday, January 14, 2021

Frase do Dia #65

Folheando livros lidos há quase uma década, no tempo em que o Umberto ainda era vivo, deparo-me com esta tirada do Eco:

Como sempre, Umberto Eco (em A Passo de Caranguejo) a definir de forma simples e certeira as coisas que importam.