Thursday, December 3, 2020
Sem número, número 47: Somos o que somos (mas às vezes podemos ser diferentes)
Wednesday, December 2, 2020
Sem número, número 46: A medida certa
Sunday, November 29, 2020
Frase do Dia #64
Às vezes, a pessoa cruza-se com um gajo que percebe das merdas. Outras, descobrimos miúdas que sabem como é isto de ser pessoa:
Excerto de «Vampires versus Werewolves», em Poukahangatus, de Tayi Tibble.
O mundo é um lugar muito grande, cheio de diferenças. Mas, estejamos cá em cima ou lá em baixo, em Portugal ou na Nova Zelândia, o que sentimos é mais parecido do que aquilo que pensamos.
Saturday, November 28, 2020
Sem número, número 45: Instabilidade
A instabilidade é uma merda que faz mal. É um facto. E quem disser o contrário, é, no mínimo, idiota. Por isso, parece-me inevitável sentir um misto de estupefacção e raiva quando leio/ouço notícias em que um chico-esperto afirma que as novas gerações se caracterizam pela instabilidade, que é «um traço» que as distingue.
Como não praguejar perante tamanha estupidez? Não se trata de «um traço» das gerações mais jovens, caros. É uma condição imposta. As novas gerações existem e têm de trabalhar num mundo onde a instabilidade lhes foi apresentada como algo inevitável. Dizer que, ao contrário das gerações anteriores, os jovens «preferem a liberdade», e que «não querem ter o mesmo trabalho para o resto das suas vidas», é (permitam-me usar a expressão estrangeira), a load of bullshit. Talvez grande parte das novas gerações optasse por um trabalho estável, ou uma vida estável, se tivesse sequer a possibilidade de escolher. Só que não tem, porque não existe.
Somos atirados para a realidade pré-existente com o pouco que temos (formação, maturidade, experiência) e, a partir daí, é desenrascar. Como se jogássemos com as cartas que um qualquer croupier escolheu para nós, tendo de nos reger pelas jogadas dos adversários, que têm na sua posse todos os trunfos de alto valor, enquanto nós tentamos apenas somar meia dúzia de pontos. Não é fácil, não é agradável, e envolve, acima de tudo, sorte. Por isso, por favor, senhores, não sejam parvos e não nos tratem como se fossemos estúpidos.
Sunday, November 8, 2020
Frase do Dia #63
Saturday, October 31, 2020
Sem número, número 44: The side effects of the aftershocks
Será este um dos efeitos da pandemia? Este mergulho na memória? Recordamos mais, viajamos nas profundidades da memória porque "vivemos" menos? Convivemos menos, estamos com menos pessoas, os momentos que temos com estas poucas são mais raros e não viajamos, não visitamos outros lugares, ou os amigos que vivem noutros países. Por isso, dou por mim inevitavelmente a relembrar o que já vivi, o que já aconteceu e foi emocionante, inesquecível, até.
Vasculhamos livros, caixas, cartas, postais. Vamos às pastas do computador, os baús modernos. Recuperamos fotos, vídeos, faixas de música. E mergulhamos nas recordações do mesmo modo que se entra nas águas quentes do Mediterrâneo. Sentimos a diferente temperatura, o mar que molha a pele e flutuamos, essa maravilhosa sensação que evoca uma dimensão distante. Recordar é assim. Produz efeitos semelhantes aos de uma droga. E, à semelhança das substâncias psicotrópicas, infelizmente (muito infelizmente), não podemos ceder o volante à memória. Corremos o risco de ficar viciados no passado, no que fomos, no que sabemos agora ter sido o nosso melhor, o tempo em que fomos belos e felizes.
Tomamos decisões no presente que serão em breve passado, tentando trilhar um futuro que nos seja confortável. Mas nunca sabemos exactamente o que estamos a fazer. Viver é um acto de fé, em si. Esperar o melhor (das decisões, das pessoas), sabendo que não sabemos nada, nunca sabemos nada (como poderíamos, se não conseguimos prever o futuro?).
Se temo pelo futuro? Temo. Muito. Racionalmente, sabíamos todos - excepto os cépticos tontos - que estes meses de Outono (e o Inverno que se aproxima) seriam assim, de contornos difíceis e nebulosos. Mas eu temo, à mesma, porque o futuro é uma incógnita. Temos de sair de casa, viver, mas o medo de transportar algo invisível connosco que acidentalmente mate toda a nossa família nuclear, é assustador. Muito assustador. E depois, como serão os próximos meses? Haverá um emprego para trabalhar? Dinheiro para viver? E alegria?
O optimismo começa a esgotar-se. E, mesmo aguardando o ano inteiro pela chegada da quadra natalícia, só posso dizer que não consigo sentir-me feliz. Não consigo entender estas promoções, campanhas para comprar presentes (as Black Friday e Cyber Mondays desta vida) quando a economia se afunda e despoja tantos do trabalho, do seu ganha-pão. Este será um Natal difícil. E talvez nem o venha a ser tanto para mim. Mas para outros.
A instabilidade abala-me o estômago. O medo entra na pele e turva o olhar. É isso. Não consigo olhar para o futuro com os óculos do optimismo. E talvez seja por isso que me vou refugiando num passado que foi feliz e trouxe amor. Algo raro e com o qual não sou presenteada com frequência. Talvez seja por isso que busco conforto na memória. E nas histórias.
Friday, October 23, 2020
Blogception #4: Um blogue dentro de um blogue
Ontem, foi o aniversário de um querido amigo e ao jantar partilhámos histórias de viagens, de lugares que visitámos juntos e outros onde ambos estivemos, mas em separado. Um desses sítios foi Bruges, onde fui muito feliz e bebi muita cerveja. Outros tempos, tutta un'altra vita.
(ALWAYS) LOOK ON THE BRIGHT SIDE OF LIFE
Há muito tempo, num post muito muito distante, declarei que a minha vida não dava um filme e teorizei sobre rotinas, afirmando que, apesar de aborrecidas, são necessárias. Esta semana, como que sentindo urgência em provar a veracidade dessa teoria, saí da minha rotina laboral, aventurando-me nuns poucos dias de férias, e, consequentemente esqueci-me que aquela era semana de Preguiça.
«Vergonha!, irresponsabilidade!», gritava a minha consciência. Como podia ser, quando anoto religiosamente a periodicidade das publicações na minha agenda e no calendário disponibilizado pelos senhores da Google? A verdade é que me esqueci porque foi uma semana atípica e só no próprio dia me dei conta do lapso.
Mas perdoe-me a meia dúzia de cidadãos leitores que duas vezes ao mês perscruta este canto. Perdoem-me, pois. Ora, encontrando-me vazia de ideias (mas cheia de chocolate), e perdendo minutos da minha vida no Facebook, apercebi-me, subitamente, graças aquelas compilações de memórias que a coisa agora faz, que o último ano (desde Fevereiro do ano passado para cá) foi dos diabos: há um ano despedia-me temporariamente do Minudências, por motivos relacionados com a minha saúde, e amaldiçoava com alguma frequência a minha mudança de cidade. Pesava sobre mim muito trabalho, uma vida não-social e uma consciência que felizmente não tem figura humana ou animal, caso contrário uma de nós já teria ido parar ao hospital vítima de violência física.
Um ano depois, em Março de 2016, ainda a procissão vai no adro e dou por mim a verificar que já cumpri umas quantas resoluções de Ano Novo: terminar a leitura d’O Bom Soldado Svejk (check), visitar uma nova cidade (Bruges, check) e arranjar um novo corte de cabelo (finalmente, check).* Sim, não elevei muito a fasquia, mas quem disse que as resoluções têm alterar a nossa vida radicalmente? Um ano depois, raras são as semanas em que após o trabalho não tenho já uma série de actividades planeadas, que podem incluir uma ida ao cinema ou ao teatro, ler um livro numa esplanada, beber copos com os colegas de trabalho no final do horário de expediente, escrever coisas novas, ver um filme no conforto do lar, conviver com os amigos (alguns novos), ou dormir uma sesta.
Não são tarefas que mudam o mundo, mas são pequenas coisas que me impelem a seguir em frente, mesmo nos momentos menos bons. Aquelas alturas em que percebemos que não estamos a fazer aquilo com que sempre sonhámos, nem moramos onde gostaríamos de morar, nem temos algumas das coisas que pensámos que teríamos por esta altura. As sombras existem, as memórias de momentos mais felizes empurram-nos para o chão e a desilusão está aí mesmo ao virar da esquina. Cada um faz o que pode e cada qual desenrasca-se como sabe (ou como intui). Nascemos sem livro de instruções (os livros, sempre os livros!) e por mais que os pais, os avós, os tios, os primos, os amigos mais velhos, os amigos da mesma idade, pessoas estranhas, nos digam para fazer assim ou assado, nada substitui a experiência e a importância de uma queda.
Ao contrário do que fazia quando era pequena, ao ler os policiais de Agatha Christie – ou seja, fazer batota e consultar o final para verificar se o meu suspeito correspondia ao criminoso – a vida não permite dar saltos em frente só para ter a certeza se a história vai acabar bem. E, ao encontrarmo-nos aqui, presos na nossa própria narrativa, a única coisa a fazer, parece-me, é continuar em frente, página a página, capítulo a capítulo, assobiando (como recomenda Eric Idle em «Always Look on the Bright Side of Life») até ao fim.
* Também fiz uma tatuagem evocando o meu adorado Dino Buzzati. Mas não o disse porque na altura era um quase-segredo. Publicado inicialmente a 14 de Março de 2016, sem alterações.
Wednesday, October 21, 2020
Equilíbrio
Se fosse fácil encontrar um equilíbrio, todos seriamos acrobatas e viveríamos no ar, entre cordas e piruetas. Seria fabuloso, assim uma espécie d'O Barão Trepador circense. Mas não é o caso e o narrador não é Italo Calvino: não é fácil manter o equilíbrio e, por maior que seja o esforço, os pés falham e, quando se dá conta, estamos na rede (quando existe uma).
O equilíbrio é o «estado neutro entre duas forças opostas», define a Treccani. É o que, a meu ver, deveria ser sinónimo de «ideal normal». Ser equilibrado deveria corresponder à norma. Seguir a direito pelo estreito caminho de cabras neste desfiladeiro pelo qual caminhamos, sem escorregar ou cair. Como os acrobatas, deveríamos tentar manter-nos ali, na corda, pé ante pé, com a respiração certa, até chegarmos ao outro lado. Mas o equilíbrio não é fácil, ao contrário da queda.
Associo, assim, o conceito de dualidade, ao equilíbrio. O que me agrada. Apesar do equilíbrio estar também muito próximo da imprevisibilidade. O que é, para mim, um dos poucos confortos que temos - se pensarmos que temos apenas uma única certeza trágica. Sabemos que vamos morrer. Isso e os impostos são os únicos elementos que temos como adquiridos. O resto é uma incógnita.
Os optimistas sairão à rua em festa perante a constatação, enquanto os pessimistas optarão por ficar em casa, não vá o diabo tecê-las: todos sabem que o mafarrico se esconde atrás da porta, normalmente do lado de fora, claro.
Não sou optimista, mas a fatalidade também me parece algo de exagerado, como os poemas de amor dos autores românticos alemães. Esse será o meu único equilíbrio: esperar sempre o pior cenário possível com um fio de esperança. Aí fico no meio. Não por ser onde está a virtude, mas porque, excepcionalmente, procuro distribuir equitativamente o peso, de modo a tocar em ambos os lados. Excepcionalmente. Eu, que sou uma criatura de forças opostas que torturam os poucos que de mim se abeiram. Não concebo, contudo, outra forma de viver que não esta, de oposto em oposto, dando o meu melhor para me equilibrar e não cair. E, se tiver de cair, tentando não o fazer de vestido e de perna no ar (situações que já ocorreram concomitantemente, à porta de casa).
Monday, October 5, 2020
Blogception#3: Um blogue dentro de um blogue
Agora que o Outono se instalou em pleno, dei por mim a pensar naquele texto produzido para a minha estreia na Preguiça-Mãe de Leiria e publicado no tasco Minudências algures na segunda quinzena de Setembro de 2015.
RECOMEÇAR
Há quem diga que os começos são difíceis. Abrir um novo caminho, dar início a uma nova tarefa. Eu ouço e penso nos recomeços. Os inícios têm a vantagem se colocar à nossa frente, sem mácula, limpos, contendo em si toda a esperança, toda a energia e todo o optimismo do que é novo.
Os recomeços são mais complicados. Repousam sobre obras inacabadas, a maior parte das vezes estão cheios de falhas, gralhas, erguem-se sobre erros do passado, obrigando a um esforço extra, frequentemente executado de forma contrariada.
E ainda assim, prefiro-os. Há nos recomeços a possibilidade de aprender com o que já está feito, mesmo que cheio de imperfeições, pejado de falhas. Não quero depositar toda a minha fé nos começos limpos, perfeitos. Desejo um recomeço que me obrigue a ser melhor, a evoluir. A aperfeiçoar-me, não obstante o que me antecedeu. Há uma certa beleza inerente aos Prisioneiros inacabados de Michelangelo Buonarroti que o David, do topo do seu pedestal, no seu esplendor marmóreo simplesmente não contém.
O Outono é para mim, então, a época dos perfeitos recomeços: não é o Ano Novo, o civil, ou o chinês, ainda que o ano se aproxime do seu fim e pouco falte para o seu término. No entanto, o Outono representa o final do Verão, que constitui para muitos o culminar do calendário.
A excitação do Verão desaparece, as horas de luz diminuem e as árvores, esses seres sábios (que Tolkien bem soube reconhecer), preparam-se para o tempo que há-de vir e recolhem-se à sua tranquilidade. É tempo de reflectir sobre o que fomos e fizemos nas duas últimas estações. Fomos bons para o(s) próximo(s)? Rimos o suficiente? Teremos sido felizes na conta certa?
Entro no Outono de férias, sem o rodopio do calor do Verão e a agitação das hormonas. Chego ao Outono com a tranquilidade das temperaturas frescas e o vento que agita os cabelos e as folhas que cobrem as calçadas.
Chego às férias ao mesmo tempo que a rentrée literária invade as livrarias. Folheio catálogos, leio listas, mas não há muito que me entusiasme. Noto um conjunto de títulos que assinalam o fim da Segunda Guerra Mundial e evocam os horrores do Holocausto. Não sei se precisamos de mais livros sobre a miséria e a crueldade humana. Num momento como este, talvez fosse mais importante celebrar a bondade dos homens. Não que ela abunde. Mas por isso mesmo: porque deve ser valorizada e apreciada e não nos devemos deixar normalizar pela banalidade do mal.
Há um livro, Uma Cana de Pesca para o Meu Avô, de Gao Xingjian, o primeiro Nobel chinês (mas que não é tido como tal por se encontrar no exílio há muitos anos), que embora não sendo um livro extraordinário, tratando-se de uma colecção de breves trechos, tem passagens belas. Numa delas, de que me recordo frequentemente, em que o avô dialoga com o neto (se a memória não me atraiçoa) diz-se que os homens são maus e que o avô prefere os tigres aos homens maus. Ainda assim, ele prefere debruçar-se sobre a «bondade do coração humano». E talvez também nós o devêssemos fazer. Não só agora, mas para sempre.
(Com algumas alterações.)
Saturday, October 3, 2020
Cenas e coisas que tais aleatórias #4
Robert Smith cantava que à sexta-feira estava apaixonado. Às sextas, eu diluo-me em álcool, à espera que a minha essência ou os meus demónios se evaporem.
Mergulho em taças de vinho à espera que os ombros abandonem o estado de alerta e permito que a minha mente recorde todos os minutos bonitos que antecederam os fins. Por instantes, um sorriso aflorará e lembrar-me-ei do dito «Mais vale ter amado...». (O conforto é válido em qualquer forma, desde que não magoe ninguém.)
Às sextas, ao final da tarde, suspende-se a soma das horas e o tempo parece eterno perante a perspetiva do fim-de-semana. Não são as vistas que encurtam. É só a vida que encolhe nos dias úteis. E nós que somos mais pequeninos nas horas que nos sobram.
(O Iggy canta melhor aquilo que penso do que o Robert. Só isso.)
Friday, October 2, 2020
Sem número, número 43: A vida, modo de usar
Sem número, número 42: Do hábito
210 dias. Passaram 210 dias desde a última vez que estive na empresa onde trabalho. Hoje regressei, ainda que apenas para buscar algumas coisas.
O percurso foi o habitual. O mesmo que fiz, diariamente, cinco dias por semana, alguns feriados incluídos, com excepção das férias e baixas, entre o dia 12 de Maio de 2014 e o dia 6 de Março de 2020. Ou seja, cerca de seis anos. Durante cerca de seis anos percorri esse caminho que, por volta das 6h30 da manhã, sem trânsito ou chuva, demora dez minutos a fazer.
O itinerário foi o mesmo, ainda que num horário diferente. E, para meu espanto, após atravessar a ponte e contornar algumas rotundas, hesitei no caminho. Foram apenas instantes, uns segundos, mas a hesitação surpreendeu-me.
Nestes seis anos de regresso a Coimbra, houve fins-de-semana em que, rumando a casa dos meus pais (que se situa no sentido oposto ao da empresa), dei por mim a caminho do trabalho. O corpo entrou em modo piloto automático - talvez o cansaço ou a cabeça a mil - e seguiu a rota dos dias úteis.
Supostamente, old habits die hard. Na verdade, descobri hoje, são apenas necessários 210 dias para quebrar uma rotina. Mas talvez nem seja preciso tanto tempo para matar um hábito. Do mesmo modo que não é impossível impor um novo. Tal como um ditador, após a queda de um, é sempre possível substituí-lo por outro. Basta tentar.
Thursday, October 1, 2020
Sem número, número 41: Memória selectiva
Wednesday, September 30, 2020
Sem número, número 40
«You've got this strange effect on me and I like it»
Monday, September 28, 2020
Frase do Dia #62
Do amor, segundo Amerigo Ortea, em O Dia de um Escrutinador, por Italo Calvino:
Saturday, September 26, 2020
Sem número, número 39 (mas que devia ter outro número)
Tentei, há algum tempo, deixar de me pensar em demasia. Porque consome muito tempo e gera ansiedade. É melhor pensar no que temos em redor. Ou melhor: em quem nos rodeia.
Durante três anos, quem me rodeava e me mantinha os pés assentes no chão, esteve ausente. Cedo me apercebi do impacto que essa ausência tinha na minha percepção da realidade. Todos precisamos de uma espécie de bússola moral, que não é, no meu caso, uma simples bússola moral. É uma real bússola humana, que me auxilia a encontrar o referente externo do "outro". Para uma pessoa egocêntrica, uma destas bússolas é essencial. Ou, pelo menos, é-o para uma egocêntrica que não quer perder o Norte.
A minha irmã é a minha bússola. Se consigo, apesar das minhas falhas, ver através de olhos alheios, é graças a ela. Nunca deixou de martelar esta dura cabeça, mesmo nos momentos mais críticos, e conseguiu sempre trazer-me de volta à realidade. E fazer-me compreender o mundo a partir do olhar dos outros.
Por isso, a poucos dos dias do seu aniversário*, escrevo estas palavras lamechas. Que são sobre mim (ou não fosse eu uma criatura que acha que é tudo sobre mim - mesmo os incêndios na Califórnia ou os terramotos na Nova Zelândia), mas não existiriam sem a minha irmã.
E é isto. Feliz aniversário, Sorella.
*Escrevi isto quatro dias antes do aniversário, mas a vida, às vezes, mete-se no meio das palavras, por isso vai só agora.
Wednesday, September 23, 2020
Blogception#2: Um blogue dentro de um blogue
Monday, September 21, 2020
Sem número, número 38: Da perda
Tuesday, September 1, 2020
Sem número, número 37 meets Cenas da vida do campo #3
Monday, August 31, 2020
Sem número, número 36: Crer para ver
Reza a Bíblia que São Tomé, um dos doze apóstolos, duvidou da ressurreição de Jesus e só ficou convencido da veracidade do sucedido após tocar as chagas de Cristo. Diz que é daí que vem a expressão «ver para crer».
No entanto, existe um fenómeno muito mais frequente que contraria a expressão e arruína mais vidas. O 'crer para ver'. É quando a pessoa acredita que alguém é de determinado modo, ainda que todas as suas atitudes contrariem, ou pouco corroborem a ideia. Ao contrário de São Tomé, quando a pessoa crê para ver, não há nenhuma imagem, nem explicação que ajude o crente a ver a realidade, que, em quase 100 por cento dos casos, não corresponde à crença.
Dir-se-á, «Quem nunca?». De facto... Quantos de nós, pessoínhas, nunca viram reciprocidade de sentimentos porque quiseram acreditar que existia? Contudo, perante o olhar geral, diz que nunca houve registo algum dessa reciprocidade. But yet, in the eye of the beholder...
Destrói sentimentos, arruína vidas... Mas há quem consiga, ao fim de algum tempo, perceber que a crença não corresponde à realidade partilhada. A frustração ajuda a abandonar a crença. Outros, nunca hão-de desistir, nunca perceberão e continuarão, até ao fim dos seus dias, a culpar o outro, que, naturalmente, é louco. Que outra explicação pode haver, se os seus vários comportamentos não correspondem à crença? Que outra explicação pode haver para alguém que sempre se acreditou que fosse Y, ainda que sempre se tenha comportado como X? Louco, naturalmente. Ou «a atravessar uma fase difícil». É sempre uma fase, porque acreditam, como quem acredita num deus que não vê, que a pessoa é Y. Embora tudo grite X.
Friday, August 21, 2020
Blogception#1: Um blogue dentro de um blogue
Passaram quase dois meses desde a última vez que escrevi para a Preguiça. Não porque me tenha deixado apanhar pela preguiça – o pecado capital e não o bicho -, mas porque fui apanhada numa curva metafórica. Qual Schumacher em Silverstone em 1999, tive de me ausentar por algum tempo para efeitos de convalescença e eis-me de regresso.
O problema de uma ausência assim é que, mesmo que se exercite o corpo, o cansaço acaba por esgotar as ideias. E sem ideias não há post. Sem post não há Minudências. Sem Minudências… oh, o que seria do mundo sem este blogue?
Como é costume, fui consultar o oráculo contemporâneo que é a Internet. Onde se vão buscar as ideias? Escrevi inspiration no Google e ele devolveu-me as seguintes expressões: «inspiration quotes», «inspiration software» e «inspiration cruises». Deveria fazer um cruzeiro, é isso? «Inspiration Cruises & Tours is a Christian travel management company specializing in group travel experiences for Christian ministries and churches since 1981.» Bom, bem sei que esta é uma época muito importante para os Católicos, mas não sei se é um cruzeiro que me safa. E o software? «Inspiration Software, Inc. is an education technology software company based in Portland, Oregon, which provides several visual thinking and learning products for the K–12 education and business markets.» Parece que fazem mind maps e coisas assim. Isso é capaz de ajudar, mas queria uma coisa mais prática.
Segui o caminho para as «quotes». Ele há aqui muitas citações sobre «fazer o impossível». Fico assustada: não quero fazer coisas impossíveis. Só queria ter uma ideia. «Acreditar» e «mudança» são palavras muito usadas. Por momentos pensei que estava no site de um partido em campanha. Acho que ainda não é isto que me vai ajudar. Escrevo «writers» e «inspiration». E aparece uma torrente de sites com estratégias, citações, recursos, tudo para que uma pessoa escreva a rodos. Ora, no tempo do Camões não havia disto. Nem sequer no tempo do Calvino.
Escrevo «what inspire writers?» e saem-me sonhos. Acho que se os sonhos me inspirassem, escreveria algo parecido com Naked Lunch, do William S. Burroughs. Não parece boa fonte. Mas diz-que o Frankenstein (Mary Shelley) e Dr. Jekyll and Mr. Hyde (Robert Louis Stevenson) foram escritos a partir de sonhos. Isso explica algumas coisas. Indago um pouco mais e parece que há muitas formas de conceber uma ideia, como viajar, ouvir música, escutar o que os outros dizem e até meditar. Fico de certa forma aliviada por saber que os autores mais conhecidos tiveram períodos em que as ideias rareavam: F. Scott Fitzgerald padeceu desse mal, mesmo tendo escrito «The Curious Case of Benjamin Button», e até o pai dos Peanuts, Charles M. Schulz (que criou centenas de tiras!). Ainda bem que escrever coisas para viver não é meu mister. Sinto-me melhor.
Lendo atentamente, procurando outros exemplos famosos de writer’s block, percebo que a maior parte dos artigos dá destaque a conselhos sobre como ultrapassar o bloqueio. E são todos muito semelhantes, apelando a que se combata a escassez de ideias com várias tentativas. Apesar das diferenças, Beckett, Twain, Atwood, todos são unânimes: tentar é preciso. Bom, nesse caso, parece que me adiantei ao conselho: voilà, acabei de criar um novo post!
Oh well, parece que estou de volta.
(Publicado a 1 de Abril de 2015, sujeito a ligeiras modificações.)
Tuesday, August 11, 2020
Frase do Dia #61
O seguinte trecho contém spoilers. Quer dizer, mais ou menos: no final, todos morremos, portanto, é um fim expectável. E o que realmente aqui interessa é o seguinte:
«Then, as his planet killed him, it occurred to Kynes that his father and all the other scientists were wrong, that the most persistent principles of the universe were accident and error.
Even the hawks could appreciate these facts.»
O filme do Dennis Villeneuve está quase aí. Mas vale a pena ler primeiro Dune, de Frank Herbert.